Terça-feira, 07 de dezembro de 2004
A garota do outdoor
“Puta que pariu”. Foram essas as primeiras palavras de Vanessa em solo mexicano, seguidas de um longo silêncio.
Logo que saiu do aeroporto, e antes mesmo de chegar ao ponto de táxi, avistou o outdoor do outro lado da rua. “Sin Solitud Café, las chicas más calientes de Mexico”. Não havia dúvida, era ela a “chica caliente” do outdoor.
Cinco segundos foi tempo mais que suficiente para que ela se recordasse e se arrependesse amargamente do dia em que concordou em tirar aquelas fotos. Entre todos motivos considerados quando da decisão de posar para tais fotos, jamais passou por sua cabeça que, oito anos mais tarde, seu rosto e seu corpo poderiam estar estampados em um outdoor de puteiro mexicano. Mas estavam.
Saber como aquela foto (tirada em Porto Alegre durante uma aula do curso de comunicação no dia 24 de setembro de 1996) podia estar estampada em um outdoor em frente ao aeroporto da Cidade do México no dia 12 de novembro de 2004 já não estava entre as maiores preocupações de Vanessa naquele momento, apesar de o questionamento “como?” cruzar seus pensamentos de quando em quando.
O que realmente a preocupava era a reação do motorista de táxi que a levaria até o hotel, do recepcionista do hotel, do carregador de malas do hotel, e mais importante, do presidente da empresa multinacional que Vanessa visitaria naqueles dias, e para a qual pretendia trabalhar caso fosse aprovada na entrevista. De repente lhe pareceu que essa aprovação ficara mais difícil que o imaginado.
Como sua passagem de volta estava marcada para a próxima semana, não encontrou outra alternativa a não ser pegar um táxi. O motorista, preocupado demais em garantir sua gorjeta para perceber que a passageira e a chica do outdoor eram a mesma pessoa, ajeitou cuidadosamente a pouca bagagem no porta-malas, subiu em seu táxi e deu início à oitava corrida do dia.
Foi grande a surpresa de Vanessa ao contar 23 outdoors do “Sin Solitud Café” pelos 16 quilometros entre o aeroporto e Chapultepec, o bairro mais nobre da cidade. Maior ainda foi seu alívio ao chegar ao hotel sem ter ouvido sequer um comentário do taxista a esse respeito.
Fez o check-in na recepção, subiu para um banho rápido e preferiu jantar no quarto. Não saiu naquele dia nem no dia seguinte, mas não podia evitar a entrevista, afinal de contas tinha ido ao México para arranjar um emprego e não para passar uma semana dentro do quarto do hotel.
Mesmo em pânico, foi à entrevista. Nem o taxista, nem a recepcionista e nem o seu futuro chefe fizeram comentários sobre sua semelhança com a “chica más caliente de Mexico”. Talvez eles não tivessem mesmo reparado. Ou talvez todos a vissem como uma puta. E ninguém quer intimidades com uma.
Apesar do nervosismo, tentou esquecer o outdoor e se concentrar na entrevista. Por mais que aparentasse tranquilidade, como teve que aprender para se manter na profissão, internamente estava desesperada. Esperava ouvir a qualquer momento a condenação de seu entrevistador. “Aqui não contratamos prostitutas”, diria ele secamente.
Não disse. Vanessa conseguiu o emprego e nessa noite saiu para comemorar, enchendo a barriga de tacos, a cabeça de tequila e os ouvidos de canções de mariachis. Pela primeira vez desde que chegara ao Mexico, sentiu-se um tanto quanto ofendida por não ser reconhecida. Afinal de contas, era ela a “chica más caliente” do país. Ou será que sua beleza havia sido consumida pelos 8 anos que a separavam da garota da foto? Todo o pânico que havia sentido naqueles dias transformou-se em raiva e insegurança.
No caminho de volta para o hotel, com a razão turvada pelo álcool, perguntou ao taxista se não a reconhecia como a garota do outdoor.
“Pero ella es solamente una chica jovencita. Tu eres mujer.”
Foi então que Vanessa compreendeu que realmente não era a menina do outdoor, e que jamais voltaria a sê-lo. E, ao contrário do que imaginava, sentiu-se feliz ao perceber que havia envelhecido.
Logo que saiu do aeroporto, e antes mesmo de chegar ao ponto de táxi, avistou o outdoor do outro lado da rua. “Sin Solitud Café, las chicas más calientes de Mexico”. Não havia dúvida, era ela a “chica caliente” do outdoor.
Cinco segundos foi tempo mais que suficiente para que ela se recordasse e se arrependesse amargamente do dia em que concordou em tirar aquelas fotos. Entre todos motivos considerados quando da decisão de posar para tais fotos, jamais passou por sua cabeça que, oito anos mais tarde, seu rosto e seu corpo poderiam estar estampados em um outdoor de puteiro mexicano. Mas estavam.
Saber como aquela foto (tirada em Porto Alegre durante uma aula do curso de comunicação no dia 24 de setembro de 1996) podia estar estampada em um outdoor em frente ao aeroporto da Cidade do México no dia 12 de novembro de 2004 já não estava entre as maiores preocupações de Vanessa naquele momento, apesar de o questionamento “como?” cruzar seus pensamentos de quando em quando.
O que realmente a preocupava era a reação do motorista de táxi que a levaria até o hotel, do recepcionista do hotel, do carregador de malas do hotel, e mais importante, do presidente da empresa multinacional que Vanessa visitaria naqueles dias, e para a qual pretendia trabalhar caso fosse aprovada na entrevista. De repente lhe pareceu que essa aprovação ficara mais difícil que o imaginado.
Como sua passagem de volta estava marcada para a próxima semana, não encontrou outra alternativa a não ser pegar um táxi. O motorista, preocupado demais em garantir sua gorjeta para perceber que a passageira e a chica do outdoor eram a mesma pessoa, ajeitou cuidadosamente a pouca bagagem no porta-malas, subiu em seu táxi e deu início à oitava corrida do dia.
Foi grande a surpresa de Vanessa ao contar 23 outdoors do “Sin Solitud Café” pelos 16 quilometros entre o aeroporto e Chapultepec, o bairro mais nobre da cidade. Maior ainda foi seu alívio ao chegar ao hotel sem ter ouvido sequer um comentário do taxista a esse respeito.
Fez o check-in na recepção, subiu para um banho rápido e preferiu jantar no quarto. Não saiu naquele dia nem no dia seguinte, mas não podia evitar a entrevista, afinal de contas tinha ido ao México para arranjar um emprego e não para passar uma semana dentro do quarto do hotel.
Mesmo em pânico, foi à entrevista. Nem o taxista, nem a recepcionista e nem o seu futuro chefe fizeram comentários sobre sua semelhança com a “chica más caliente de Mexico”. Talvez eles não tivessem mesmo reparado. Ou talvez todos a vissem como uma puta. E ninguém quer intimidades com uma.
Apesar do nervosismo, tentou esquecer o outdoor e se concentrar na entrevista. Por mais que aparentasse tranquilidade, como teve que aprender para se manter na profissão, internamente estava desesperada. Esperava ouvir a qualquer momento a condenação de seu entrevistador. “Aqui não contratamos prostitutas”, diria ele secamente.
Não disse. Vanessa conseguiu o emprego e nessa noite saiu para comemorar, enchendo a barriga de tacos, a cabeça de tequila e os ouvidos de canções de mariachis. Pela primeira vez desde que chegara ao Mexico, sentiu-se um tanto quanto ofendida por não ser reconhecida. Afinal de contas, era ela a “chica más caliente” do país. Ou será que sua beleza havia sido consumida pelos 8 anos que a separavam da garota da foto? Todo o pânico que havia sentido naqueles dias transformou-se em raiva e insegurança.
No caminho de volta para o hotel, com a razão turvada pelo álcool, perguntou ao taxista se não a reconhecia como a garota do outdoor.
“Pero ella es solamente una chica jovencita. Tu eres mujer.”
Foi então que Vanessa compreendeu que realmente não era a menina do outdoor, e que jamais voltaria a sê-lo. E, ao contrário do que imaginava, sentiu-se feliz ao perceber que havia envelhecido.